sábado, julho 15, 2006

Sutilezas do Cuidado*


Ela estava deitada, com os olhos fechados, corpo e alma prestes a se encontrarem na ante-sala do sono e darem-se as mãos para seguirem rumo à este desejado mistério. O livro já dormia, com todos os seus personagens abandonados sobre seu seio, á mercê do sobe e desce de seu respirar. Foi quando ele abriu a porta e olhou longamente para a filha. Acabara de saber de outrem que ela estava adoentada e por isso não tinha ido ao trabalho. Ia reclamar-lhe por ela não ter avisado; já dissera-lhe mil vezes que ao menor sinal, que não era pra ter medo de médico e outros tantos quês. Mas quando a viu ali, adormecida, a respiração levemente ofegante; calou-se antes de começar a falar. Aproximou-se. Colocou o dorso da mão sobre sua testa suada e constatou uma tênue febre. Decidiu-se por não incomodá-la. Procurou um ventilador, posicionou-o defronte à moça e procurou pacientemente o melhor ângulo para o vento refrescar-lhe o corpo. Quando achou que estava bom, dirigiu-se novamente para porta, abriu-a e. . Abriu-a e antes de sair , fechando-a, olhou pr´aquela filha. Ela podia sentir aquele olhar. Podia vê-lo, mesmo estando com os olhos fechados. Era um olhar de tanto amor, tanto amor que continha medo. Ela gostaria de ter visto de verdade o olhar, antes de ser comovido pelo medo, mas ficou o tempo todo com os olhos cerrados. Ele fechou a porta afinal. E foi-se sumindo com o barulho de seus passos no corredor. Ela abriu os olhos e olhou para o teto. O sono havia passado completamente. Pegou o livro e recomeçou a leitura; as páginas agitadas pelo vento. De vez em quando era bom ficar doente.



*texto republicado do ex-blog www.ginaemanuela.blog.uol.com.

Um comentário:

Anônimo disse...

saudade, vi? :*