
Hoje é seu aniversário; 55 anos você faria caso estivesse aqui neste planeta absurdo e nós faríamos uma grande festa. Fossem outros os tempos, tentaríamos despistá-la para fazer uma surpresa, e vc fingiria que não sabia de nada pra nos agradar enquanto tentávamos agradá-la. Se você já estivesse doente a festa ia ser mais intensa, com ar de saudade, com o medo e a quase certeza de que seria ela a última, como foi a última. E você, mais triste que feliz, faria um esforço estrondoso pra não chorar sua própria vida indo-se em mais um ano de lutas. E olharia-nos com seus olhinhos que haviam ficado maiores, porque seu rosto estava mais magro e suas sobrancelhas haviam quase desaparecido. E pelo seu crescido olhar ia querer transmitir todo o amor que sempre nos teve, prometendo que sempre o teria, estivesse onde estivesse. Mas eu ia ver, eu ia ver a apreenção que você tentava disfarçar porque o medo que sentia da morte não devia ser nosso, e sim só seu, visto que só você se ia e teríamos que, corajosos, continuar. Ia ser uma festa estranha, de dúvidas e desesperos existenciais mal dissimulados em afetuosas demonstrações de força. Onde você está agora? Onde você está agora, como vocês comemoram os anos? Há tempo? Adianta se eu lhe levar algumas flores no túmulo? Pode sentir o amor que lhe dou com elas, onde está? Caso possa, tenho certeza que pode também ler o que ainda não sei escrever. Feliz aniversário, mãe. E tudo que tiver embutido nisso.
Sempre sua ,
Gina
Ps. O pai acabou de chegar com as flores